quinta-feira, 23 de setembro de 2010

A confirmação

O trânsito tava muito lento, mas meu coração estava muito fadigado. Eu queria gritar, chorar, rolar no chão de dor, mas eu só conseguia manter aquela cara de pessoa centrada, ficava olhando as ruas centrais de Juiz de Fora e me lembrava de quando eu passava por ali com a beleza e inocência de meus quase vinte. Aquele resultado maldito que não ficava pronto. Mais de um mês de espera e logo  na segunda o laboratório só abre as 17 h para entrega de resultados. Eu estava ficando louco com tanta pressão. Queria uma resposta, em como seria minha vida a partir dali.  Eu sabia que o que estava para acontecer era uma tragédia muito grande, mas não admitiria nunca que fosse uma fatalidade. Então eu colocava minha cabeça sempre no lado da razão. Não iria querer esses dramalhões mexicanos de que tanto repugno. Projetava a imagem de como eu acharia que as pessoas deveriam se comportar diante das tragédias da vida e sempre me vinha na cabeça uma musica da Zélia Duncan que diz “um homem com uma dor é muito mais elegante”. Essa música se tornou o meu lema....
            Quando cheguei ao COAS (centro de testagem e aconselhamento) foi mais um suplício. Devo ter aguardado aproximadamente 40 minutos. Toda hora a aconselhadora passava de uma sala para a outra, com um papel branco nas mãos, olhava para mim e sorria. Eu pensava comigo que aquele sorriso era o primeiro passo para dar a pior notícia que eu receberia em minha vida até aquele momento. Comecei a suar feito uma mina, o odor começou a subir pelos meus braços, até que chegou a hora...
            Quando a conselheira abriu o envelope fez aquela cara de tragédia e exclamou “iii Hivo, deu positivo”. Não sei explicar bem o que aconteceu dentro de mim, dentro da minha cabeça, eu simplesmente continuei com a mesma cara altiva de sempre, sem esboçar nenhum tipo de reação. Só perguntei a ela qual seria o próximo passo e recebi uma série de explicações de como iria ter que conduzir minha vida, com restrições, sem os abusos que eu estava acostumado a cometer. Imaginei que não seria fácil, mas para mim nada nunca foi fácil. Sai do COAS e fui direto à Bela, uma amiga que joga búzios. Cheguei lá tranqüilo, mas quando ela abriu os búzios para mim e comecei a chorar, antes de ouvir qualquer coisa. Ela simplesmente me disse que se eu continuasse a chorar e me colocasse como vítima, isso sim seria a minha morte, o meu fim. Acreditem se quiser, mas os búzios revelaram apenas coisas positivas...
            Saí da loja da Bel e fui encontrar com a Nívea, uma amiga, quase irmã, que sofreu junto comigo nessa espera louca por esse maldito resultado. Fomos ao Morro do Cristo fumar um baseado e chorar juntos, mas eu não conseguia derramar uma lágrima, pensando no que a Bel me disse, na verdade eu tive que consolá-la. Após o baseado o mundo voltou a ter cor... O engraçado é que toda hora vinha uma dúvida terrível, conto ou não para meus pais. No final da onda do beck eu resolvi que não contaria. Resolvi que não farei mais nenhum exame em Juiz de Fora. Como estou sendo transferido para BH vou me cuidar por lá, longe dos olhos protetores de meus adorados pais.
            Antes dessa decisão precisei conversar com uma médica, que por coincidência eu conhecia da época que trabalhei como recepcionista no Hospital Universitário de Juiz de Fora. A primeira frase que ela me disse foi “éramos bem mais jovens desde a última vez que nos vimos”, eu dei aquele sorriso forçado para não ser desagradável. De tudo o que ela me disse a maioria eu já sabia, mas uma coisa me tocou fundo, parece um clichê, mas quando se está em uma situação onde toda a sua maneira de viver deve ser repensada, foi muito bom ouvir que “você precisa ficar de luto, não tenha vergonha, após o luto você vai encontrar a maneira certa de continuar a viver”.
            Ainda estou de luto, mas não estou infeliz, estou muito triste, aliás visivelmente triste e a música da Zélia sempre vem a minha mente. Preciso aprender a gostar mais de mim, porque acho que vou viver sozinho agora, sem um companheiro. Afinal, vamos ser realistas, quem vai querer namorar, se relacionar ou até mesmo se casar com alguém soropositivo? Eu não gostaria se eu não fosse um. 

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